sexta-feira, 28 de novembro de 2014

A gente nasce, cresce e aprende a voar

Época de verão

Época de verão
Criança, a vida é fácil
Os peixes pulando fora d'àgua
E o algodão, Senhor
O algodão está alto, Senhor, tão alto

Seu pai é rico
E sua mãe é de tão boa aparência
Ela parece bem agora
Calma, baby, baby, baby, baby, baby agora
Não, não, não, não, não, não, não
Não chore, não chore

Em uma destas manhãs
Você levantará, cantando animada
Você estará alargando as suas asas
Criança, e alcançar, alcançar o céu
Senhor, o céu

Mas até esta manhã
Querida, nada vai te machucar
Não, não, não, não
(Summertime-Janis Joplin)

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

O velho Drummond

Verdade

A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em metades
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
 
Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Tarja preta

Estou

Estou (Álvaro de Campos)

Estou tonto,
Tonto de tanto dormir ou de tanto pensar,
Ou de ambas as coisas.
O que sei é que estou tonto
E não sei bem se me devo levantar da cadeira
Ou como me levantar dela.
Fiquemos nisto: estou tonto.
Afinal
Que vida fiz eu da vida?
Nada.
Tudo interstícios,
Tudo aproximações,
Tudo função do irregular e do absurdo,
Tudo nada.
É por isso que estou tonto ...
Agora
Todas as manhãs me levanto
Tonto ...
Sim, verdadeiramente tonto...
Sem saber em mim e meu nome,
Sem saber onde estou,
Sem saber o que fui,
Sem saber nada.
Mas se isto é assim, é assim.
Deixo-me estar na cadeira,
Estou tonto.
Bem, estou tonto.
Fico sentado
E tonto,
Sim, tonto,
Tonto...
Tonto.

Nossa carne animal, terrena e diabólica

(Em face dos últimos acontecimentos-Carlos Drummond de Andrade - youtube.com/Patricia Kalil)

O vento murmurante

(Blowing in the wind - Joan Baes - Youtube.com/Gcsab23)

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Patrizia Donatella Streparava



José


E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
(Carlos Drummond de Andrade)

Lembranças

Onde seremos sempre queridos e bem recebidos
(The long and winding road-The Corrs - Youtube.com/Vsbonvenutoleg)

Faça amor, não faça guerra

Se procurar bem você acaba encontrando.
Não a explicação (duvidosa) da vida,
Mas a poesia (inexplicável) da vida.

Carlos Drummond de Andrade

A simplicidade de Deus enlouquece os homens

Que ninguém se engane, só se consegue a simplicidade através de muito trabalho.
Clarice Lispector

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Para sempre patinho feio

Se

Se eu fosse um cisne, eu teria partido
Se eu fosse um trem, eu estaria atrasado
E se eu fosse um homem bom
Conversaria com você
Mais frequentemente do que faço

Se eu estivesse adormecido, poderia sonhar
Se eu estivesse com medo, poderia me esconder
Se eu enlouquecer
Por favor não coloque os seus fios no meu cérebro

Se eu fosse a lua, eu seria frio
Se eu fosse uma regra, eu a quebraria
Se eu fosse um homem bom
Eu entenderia as distâncias entre os amigos

Se eu estivesse sozinho, eu choraria
E se eu estivesse com você, estaria em casa e enxuto
E se eu enlouquecer
Você ainda me deixaria participar do jogo?

Se eu fosse um cisne, eu teria partido
Se eu fosse um trem, estaria atrasado novamente
E se eu fosse um homem bom
Conversaria com você
Mais frequentemente do que faço

Frio na Alma

Queria que Você Estivesse Aqui

Então, então você acha que consegue distinguir
O Paraíso do Inferno
Céus azuis da dor
Você consegue distinguir um campo verde
de um frio trilho de aço?
Um sorriso de um véu?
Você acha que consegue distinguir?

Fizeram você trocar
Seus heróis por fantasmas?
Cinzas quentes por árvores?
Ar quente por uma brisa fria?
Conforto frio por mudança?
Será que você trocaria
Uma pequena participação na guerra
Por um papel principal numa cela?

Como eu queria
Como eu queria que você estivesse aqui
Somos apenas duas almas perdidas
Nadando num aquário
Ano após ano
Correndo sobre o mesmo velho chão
O que encontramos?
Os mesmos velhos medos
Queria que você estivesse aqui

domingo, 5 de outubro de 2014

Congregação Cristã no Brasil

A grade
Autor: Carl August Sandburg
Agora que a mansão está concluída, os trabalhadores começam a grade. São barras de ferro com pontas de aço capazes de tirar a vida a quem se arrisque sobre elas. Uma obra prima que impedirá a entrada de famintos, crianças de rua e vagabundos. Vagabundos de toda espécie. Entre as barras e sobre as pontas de aço nada passará exceto a chuva, a morte e o dia de amanhã.
Sobre o autor: Carl August Sandburg
Carl August Sandburg (1878 – 1967), foi poeta, historiador, novelista e folclorista. Nasceu nos EUA e tornou-se conhecido por suas poesias e sua biografia de Abraham Lincoln, pelas quais recebeu o Prêmio Pulitzer

domingo, 22 de junho de 2014

Sabedoria divina

As religiões são como vaga-lumes: para brilhar precisam das trevas.
Arthur Schopenhauer

Predestinação

O tempo é um rio que leva ou afoga. Nesse rio, se nada. E nele, ninguém manda.
Os grandes homens foram os que entenderam bem os seus tempos.
Entenderam que não amanhece porque o galo canta, mas que o galo canta porque amanhece.
Imre Madách

Ontem, hoje e eternamente

(The Hollies-the air that i breathe - Youtube.com/erospsiquejr)

Perdão a quem perdoa

O Morcego”
Meia-noite, ao meu quarto me recolho.
Meu Deus ! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho
” Vou mandar levantar outra parede …”
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre minha rede
Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A consciência humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto.

(Augusto dos Anjos)

O amor platônico

Presságio
O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar pra ela,
Mas não lhe sabe falar.
Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente…
Cala: parece esquecer…
Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pra saber que a estão a amar!
Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!
Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar…

(Fernando Pessoa)

sábado, 21 de junho de 2014

Sobre ser adulto

Creedence clearwater revival-Someday never comes - Youtube.com/Marcelo Rolon)

Rosa de Saron

Stairway to heaven-Led Zeppelin - Youtube.com/Celio Moraes)

"Bem aventurados os pobres de espírito"

Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo.
Clarice Lispector
Play

Um dia me disseram
Que as nuvens não eram de algodão
Um dia me disseram
Que os ventos às vezes erram a direção
E tudo ficou tão claro
Um intervalo na escuridão
Uma estrela de brilho raro
Um disparo para um coração

A vida imita o vídeo
Garotos inventam um novo inglês
Vivendo num país sedento
Um momento de embriaguez

Somos quem podemos ser
Sonhos que podemos ter

Um dia me disseram
Quem eram os donos da situação
Sem querer eles me deram
As chaves que abrem esta prisão
E tudo ficou tão claro
O que era raro ficou comum
Como um dia depois do outro
Como um dia, um dia comum

A vida imita o vídeo
Garotos inventam um novo inglês
Vivendo num país sedento
Um momento de embriaguez

Somos quem podemos ser
Sonhos que podemos ter

Um dia me disseram
Que as nuvens não eram de algodão
Sem querer eles me deram
As chaves que abrem esta prisão

Quem ocupa o trono tem culpa
Quem oculta o crime também
Quem duvida da vida tem culpa
Quem evita a dúvida também tem

Somos quem podemos ser
Sonhos que podemos ter

Link: http://www.vagalume.com.br/engenheiros-do-hawaii/somos-quem-podemos-ser.html#ixzz35L4fLlHj
A vida é uma luta renhida que aos fracos abate e que aos fortes só faz exaltar.

(Gonçalves Dias)